Muitas pessoas, espaços, tempos e modos de vida contam a história humana. Aos fatos considerados grandiosos, dignos de registros, narrativas sobre a vida comum, de pessoas comuns, se oferecem e se juntam como em um mosaico e nos dizem quem somos, o que tememos, com o que sonhamos e como vivemos. Em pequenas ou grandes cidades, encontros e desencontros, nascimentos e mortes, alegrias e tristezas acontecem todos os dias. Entre pontos convida seus leitores a uma observação singular desse mundo grande e complexo.

Trata-se da história de uma família e de um tempo contada, em primeira pessoa, por Pedro. Centrada na admiração por seu Álvaro, seu pai, a narrativa se desenvolve a partir da apresentação minuciosa e afetiva dos personagens que ao longo do tempo fizeram parte da vida do menino: a mãe e seus patrões, os irmãos, o companheiro de trabalho do pai, a colega de escola que se torna namorada e esposa e, principalmente, o ônibus dirigido por seu Álvaro, cenário e fio condutor das memórias do narrador. Porque não tem com quem ficar em casa enquanto todos trabalham, Pedrinho passa os dias no ônibus guiado pelo pai. Nessas viagens, conhece pessoas que marcam indelevelmente toda a sua vida.

“Se fiquei triste? Nem um pouco. Tinha construído, durante anos, recordações duradouras de infância boa, cheias de histórias, amizades e emoções. Base forte, sólida. Sem falar de Bia, minha molécula, como dizia Isaías. Amiga, namorada, noiva, mulher e mãe dos meus filhos. Conheci ali, na escola. Levava comigo no coração, na alma e na vida. Muito além de tijolos, cimento e ferro. Minhas lembranças, essas sim, eram indestrutíveis.”

Sensível e comovente, o livro de J. L. Amaral envolve os leitores em suas histórias. Sentimo-nos próximos dos personagens, celebrando suas conquistas e chorando suas perdas. Sem a exigência de conhecer São Paulo, experimentamos a vida nas grandes cidades, acompanhando a rotina de trabalho de seu Álvaro e de Isaías com os passageiros que, juntos, são uma amostra da sociedade brasileira. A leitura de Entre pontos é, sem dúvida, uma contemplação de nós mesmos.

Fabíola Farias

Graduada em Letras, mestre e doutora em Ciência da Informação pela UFMG, com pós-doutorado em Educação pela UFOPA. Dedica-se à pesquisa e a projetos sobre leitura, formação de leitores, bibliotecas, livros para crianças e jovens e valorização da cultura da infância.